sábado, 13 de novembro de 2010

Inventário e Partilha

Por: Wilson Pontes Maziero




1 - INOVAÇÕES LEGISLATIVAS;


O diploma legal de n° 11.441, de 4 de janeiro de 2007, trouxe nova roupagem para a realização do inventário, partilha e divórcio consensual[1], eis que seu procedimento poderá ser realizado também por via administrativa (desde que seja de forma amigável e quando todos os interessados forem capazes) deslocando-se o cidadão comum até o cartório mais próximo em vez do Judiciário.

O escopo da Lei 11.441/07 encontra legenda/raiz na Emenda Constitucional de n° 45 (Reforma do Judiciário) que, no caso, procurou solucionar de forma célere e econômica os problemas tratados pelo Direito de Família e pelo Direito das Sucessões, estampando o chamado procedimento administrativo ou extrajudicial (feito por escritura pública).

É importante ressaltar que a lei em análise, por falta de detalhamento no seu modus operandi, passou a ser analisada em conjunto com outras fontes normativas, exempli gratia: a Resolução nº 35/2007, do Conselho Nacional de Justiça (acrônimo CNJ), e com o Provimento nº 118/2007, do Conselho Federal da OAB (acrônimo CFOAB). É importantíssima a análise dessas fontes normativas para entender melhor a realização do instituto.[2]


2 - O INVENTÁRIO;


O que vem a ser o inventário? É nada menos que um procedimento de cunho especial e de natureza civil, cujo objetivo é relacionar, avaliar e partilhar os bens do de cujus entre os seus herdeiros e os seus legatários.

Nas sábias lições de Sílvio de Salvo Venosa[3], em sua douta obra[4], o inventário é “uma descrição pormenorizada dos bens da herança, tendente a possibilitar o recolhimento de tributos, o pagamento de credores e, por fim, a partilha” (VENOSA, 2008, p. 35).

Tal acontecimento somente ocorre com o falecimento do de cujus, doravante o autor da herança, sendo a sucessão aberta e os bens (patrimônio hereditário) transmitidos de forma una para os herdeiros. “Os herdeiros se mantêm em estado de comunhão até que se ultime a partilha” (Idem, ibidem).

O interesse para que aja a partilha dos bens – que se realiza de forma justa e pacífica - é tanto dos herdeiros (necessários, cônjuge, companheiro, etc.) quanto do próprio Estado, eis que o mesmo se assume como o destinatário do tributo decorrente da causa mortis.

Considerando que há interesses ferozes acerca do processo de inventário, da partilha, etc., o juiz do inventário nomeia o inventariante, ou seja, aquele que é o responsável pela administração dos bens da herança.[5]


O artigo 1797, do Novo Código Civil de 10 de janeiro de 2002[6], diz algo a esse respeito:


(...) “Até o compromisso do inventariante, a administração da herança caberá, sucessivamente:
I - ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão;
II - ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais de um nessas condições, ao mais velho;
III - ao testamenteiro;
IV - a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas nos incisos antecedentes, ou quando tiverem de ser afastadas por motivo grave levado ao conhecimento do juiz
.”


A tarefa do inventariante nesta empreitada é simples: auxiliar o juízo do inventário. Cabe ao inventariante a administração, a guarda e a defesa dos bens da herança, sendo esta função mais importante do que as dos herdeiros, embora estes possam fazê-lo por seus próprios meios e iniciativas. Logo, é o inventariante a parte citada nas ações que envolvam o espólio, como também propor ações em que seja o autor, pelos motivos já mencionados. Admite-se a assistência dos demais herdeiros no processo.

Fato importante a mencionar diz respeito ao inventariante dativo, eis que poderá tão somente assumir a função de administrador da herança, não lhe sendo permitida a representação do espólio.

A regra de nomeação do inventariante se faz presente na cabeça do artigo 990 do Código de Processo Civil, in verbis:



O juiz nomeará inventariante:
I - o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste;
II - o herdeiro que se achar na posse e administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou estes não puderem ser nomeados;
(Redação dada pela Lei nº 12.195, de 2010)
III - qualquer herdeiro, nenhum estando na posse e administração do espólio;
IV - o testamenteiro, se Ihe foi confiada a administração do espólio ou toda a herança estiver distribuída em legados;
V - o inventariante judicial, se houver;
Vl - pessoa estranha idônea, onde não houver inventariante judicial.
Parágrafo único. O inventariante, intimado da nomeação, prestará, dentro de 5 (cinco) dias, o compromisso de bem e fielmente desempenhar o cargo
.”




2.1 – FORO COMPETENTE;


O artigo 1785, do Novo Código Civil[7], dispõe que a sucessão será aberta no lugar do último domicílio do de cujus ou do falecido, sendo este o local em que deverá ser realizado o inventário.


E se o falecido possuía vários imóveis em seu nome e veio ao óbito? Qual deverá ser o domicílio eleito para realizar o inventário? Segundo a Lei, o domicílio competente deverá ser sempre o último. Se vier ao óbito no estrangeiro e possuir domicílio no Brasil, será esta última jurisdição a eleita para que ocorra o procedimento do endosso da herança.


O parágrafo único do artigo 96, do Código de Processo Civil possui a tarefa de preencher casos dúbios ou possíveis lacunas legislativas, eis que trata das ressalvas da competência do foro “da situação dos bens, se o autor da herança não possuía domicílio certo e do lugar em que ocorreu o óbito se o autor da herança não tinha domicílio certo e possuía bens em lugares diferentes”.[8]


Com essas considerações, afirmamos que “o juízo do inventário é universal, competindo-lhe decidir as ações relativas” (VENOSA, 2008, p. 36).


3 - O ARROLAMENTO;


O arrolamento mostra-se bastante útil na via prática, pois permite menos formalidade na realização do procedimento da partilha. Sem o arrolamento, a chegada até a partilha seria muito mais morosa, ainda que desconsideremos a morosidade de praxe do Judiciário devido ao excesso de labor.


A Lei 11.441/07 autoriza ainda o inventário por escritura pública, desde que não haja incapazes ou não haja o testamento.


Considerando que todos os interessados sejam capazes e que não haja conflito no esteio da partilha, cada um destes devem se apresentar no momento do requerimento (a partilha pode ser por meio de instrumento público ou instrumento particular), a exceção se mostra quando há agentes incapazes, discordância entre os interessados (exempli gratia, o herdeiro, legatário, testamenteiro ou credor do espólio) ou até mesmo quando há herdeiros ausentes.


Todos os interessados devem estar devidamente representados nos autos e sob a representação de seu(s) respectivo(s) procurador(res), doravante os advogados (v. o artigo 133, caput, da C.F).[9]


4 – SONEGADOS;


É considerado sonegado todo aquele que usa de meio ardil para ocultar, de forma maliciosa, bens da herança e que fazem parte do processo de inventário do de cujus, entre os seus herdeiros e legatários.


A este agente ficará sujeito às penalidades de cunho civil, ínsito do direito sucessório, doravante a sonegação.


No arrazoado de Itabaiana de Oliveira, este considera a sonegação como sendo “a ocultação dolosa de bens que devam ser inventariados ou levados à colação” (VENOSA apud OLIVEIRA, 2008, p. 348).


O Novo Código Civil, em seu artigo 1992, cuida da matéria, in verbis:


“O herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia.” (...)



Há casos em que a prática da sonegação consistirá também no crime de estelionato ou apropriação indébita (artigos 171 e 168, respectivamente, do Código Penal). Prejuízo maior para o sonegador, eis que tal condenação reforçaria os danos nefastos no plantel civil, podendo inclusive responder pelo equivalente mais as perdas e danos.


A significação do verbete sonegar remete a ideia de ardil frio e inescrupuloso, da má-fé que só pode advir do ganancioso que forja o patrimônio de todo um conjunto de herdeiros para o dele próprio, ou seja, não há razão alguma para punir aquele que oculta patrimônio ou que não o declara em razão de boa-fé complacente e não por astúcia.


Há flagrante diferença entre os departamentos ora expostos. Ou seja, entre o bem e o mal.


5 – A PARTILHA;


Diz-se que há a partilha quando já foram concluídos os trabalhos do arrolamento ou do inventário, quando há a totalidade do acervo patrimonial construído ao longo da vida do de cujus, cuja tramitação se perfaz nos mesmos autos do processo do inventário, unidos pelo apenso.


Logo, a partilha é “a divisão dos bens entre os herdeiros e legatários e a separação da meação do cônjuge ou direitos do companheiro, se for o caso” (VENOSA, 2008, p. 369).


Feito isso, a posse e a propriedade ocorrerá com a sucessão, tão logo ocorra o óbito do de cujus ou do falecido. Nesse fenômeno se perfaz a saisine, que impõe a regra da imediatidade no endosso/transferência dos bens aos herdeiros necessários e facultativos, cônjuge supérstite (ou cônjuge sobrevivente), companheiro (a) e legatários.


Qualquer herdeiro pode requerer a partilha, ainda que o testador haja disposto em contrário. Admite-se também que os cessionários e os credores do espólio possam requerê-lo.


5.1 – A SOBREPARTILHA;


Este é um fenômeno ocorrente em casos que, “por qualquer razão, feita a partilha, restarem bens impartilhados, devem ser feitas uma ou mais partilhas adicionais” (2008, p. 381).


O Novo Código Civil, em seu artigo 2021, dispõe a seguinte regra, in verbis:


Quando parte da herança consistir em bens remotos do lugar do inventário, litigiosos, ou de liquidação morosa ou difícil, poderá proceder-se, no prazo legal, à partilha dos outros, reservando-se aqueles para uma ou mais sobrepartilhas, sob a guarda e a administração do mesmo ou diverso inventariante, e consentimento da maioria dos herdeiros.”


O Novo Código Civil dispõe que haverá nova partilha de bens, sendo esta sobrepartilha realizada nos mesmos autos, apesar de se tratar de uma outra ação de inventário e partilha, incluindo o que antes fora excluído, seja em razão de boa-fé ou em decorrência de astúcia.



6 – CONCLUSÕES

A morte é evento certo, que leva tanto à reflexão quanto ao pranto, do ódio de seu causador até a saudade, quando o evento ocorre de forma natural.


Devido à certeza de que o presente fenômeno é intrínseco à realidade circundante do homem, o direito o regula secularmente.


Na contemporaneidade, o instituto pode ser feito por via administrativa ou extrajudicial (por escritura pública), pelas razões já expostas, o que facilita o desgaste já sofrido, em regra, pela perda do ente querido.





BIBLIOGRAFIA UTILIZADA


Novos comentários sobre inventário e partilha pela via administrativa. http://jus.uol.com.br/revista/texto/17357/novos-comentarios-sobre-inventario-e-partilha-pela-via-administrativa. Acesso em: 9 nov. 2010.


Presidência da República. http://www.presidencia.gov.br/legislacao/ . Acesso em: 4 nov. 2010.


Recanto das Letras. Inventário e Partilha. http://recantodasletras.uol.com.br/textosjuridicos/1279564. Acesso em: 9 nov. 2010.


VADE MECUM Acadêmico de Direito. Quarta Edição. 2008. Editora Atlas.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Direito das Sucessões. Oitava Edição. Editora Atlas. 2008.





Notas de rodapé:



[1] Chamamos a atenção do dileto leitor para o fato de que suprimimos a expressão “separação consensual” das possibilidades constantes na Lei nº 11.441/07, tendo em vista a Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, que deu nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, suprimindo o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos. JORGE, Alan de Matos. Novos comentários sobre inventário e partilha pela via administrativa. Informações disponíveis no link: http://jus.uol.com.br/revista/texto/17357/novos-comentarios-sobre-inventario-e-partilha-pela-via-administrativa. Acesso em: 18 out. 2010.
[2] Para maiores informações, acesse o link: http://www.presidencia.gov.br/. Acesso em 13, nov. 2010.
[3] Juiz aposentando do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, tendo exercido a magistratura nesse Estado por 25 anos. Integrante do corpo de profissionais de grande escritório jurídico brasileiro. Consultor e assessor de escritórios de advocacia. Foi professor em várias faculdades de Direito no Estado de São Paulo. Professor convidado e palestrante em instituições docentes e profissionais em todo o País. Membro da Academia Paulista de Magistrados. Informações disponíveis no link: http://www.oyo.com.br/autores/nao-ficcao-outros/silvio-de-salvo-venosa/. Acesso em 13, nov. 2010.
[4] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Direito das Sucessões. Oitava Edição. Editora Atlas. 2008.
[5] Importante ressaltar que há a figura do administrador provisório, ou seja, aquele que representa o espólio ativa e passivamente (vide o artigo 986 do CPC), até que venha a figura do inventariante e preste o compromisso
[6] Para maiores informações, acesse o link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm. Acesso em 08, nov. 2010.
[7] Idem.
[8] Para maiores informações, acesse o link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5869compilada.htm. Acesso em 08, nov. 2010.
[9] Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.

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